Tem também sido referido o elevado nível de corrupção como um dos principais factores indutores de descontentamento na sociedade grega. Os dados da “Tranparency International” (“2008 Corruption Perceptions Index”, Setembro 2008) atestam a percepção da Grécia como um Estado muito afectado pela corrupção: entre 31 países europeus, a Grécia, com um índice de 4.7 num máximo de 10, só aparece à frente da Lituânia, da Polónia, da Roménia e da Bulgária. Portugal, também mal classificado, fica ainda assim na 19.ª posição, com um índice de 6.1 (clicar no quadro para aumentar):
Mas onde a Grécia fica verdadeiramente mal colocada, tanto em relação a Portugal como face ao resto da Europa Ocidental, é na confiança nas instituições, em especial nas duas que têm sido mais postas em causa nos últimos dias por aqui: a polícia e os políticos. Os dados apresentados abaixo, publicados pela GfK (“GfK Trust Index”, Agosto 2008), são particularmente reveladores. A percentagem dos inquiridos no âmbito deste estudo que diz confiar nos políticos não vai além de 13% no conjunto da Europa Ocidental e de 14% em Portugal. A mesma percentagem é, no entanto, de 9% na Grécia: o valor mais baixo de entre todos os países em análise, incluindo países da Europa central e de leste. Relativamente à confiança na polícia, os valores são particularmente dramáticos: só 42% dos inquiridos na Grécia diz confiar na sua polícia, um valor 20 pontos percentuais inferior ao 2.º pior resultado da Europa Ocidental (França), 33 pontos percentuais pior que os 75% de Portugal (mesmo valor para o total da Europa Ocidental) e apenas superior aos números apresentados pela Polónia e pela Rússia! A Grécia apresenta, de resto, valores consideravelmente inferiores à média da Europa Ocidental para os níveis de confiança em outros agentes fundamentais para o funcionamento regular da sociedade: médicos, professores, forças armadas, advogados e gestores (clicar no quadro para aumentar).
P.S.: Uma ressalva que tenho que referir aos meus colegas gregos sempre que comparo a Grécia e Portugal. A minha imparcialidade não é afectada pelo sucedido num certo Junho de 2004, em Lisboa. Pelo menos de forma consciente.
Os elevados níveis de corrupção da Grécia podem pois estar a contribuir para cristalizar uma distribuição bastante desigual do rendimento disponível. Mais: têm minado a confiança dos cidadãos no seu Estado, levando a um cepticismo generalizado e extremo face ao funcionamento das instituições. À luz destes factos, a explosão anarquista registada nos últimos dias na Grécia, detonada pela morte do jovem Alexandros Grigoropoulos, parece mais fácil de entender.
P.S.: Uma ressalva que tenho que referir aos meus colegas gregos sempre que comparo a Grécia e Portugal. A minha imparcialidade não é afectada pelo sucedido num certo Junho de 2004, em Lisboa. Pelo menos de forma consciente.
6 comentários:
Luís, obrigado por esta síntese bem fundamentada que nos deixas. Ajuda a perceber melhor o perfil grego e as suas semelhanças com o fado português.
Abraço!
P.S. Ai aquele Junho de má memória... ;)
Caro Luís,
Há um mapa que coloca no seu blogue e que se refere à distribuição da riqueza. Gostava de lhe perguntar o seguinte: a justiça é igualitária ou a justiça é dar a cada a proporção daquilo que foi o seu contributo para o bem estar social, em geral?
Um abraço
António T
Caro António,
A questão é que a corrupção perverte a desejável relação de proporcionalidade entre o rendimento de cada um e o seu contributo para o tal “bem estar social” que refere. A corrupção perpetua uma distribuição injusta do rendimento, canalizado não para os que mais contribuem mas para aqueles que aproveitam em causa própria o facto de terem relações próximas de poderes específicos. É o exemplo típico do médico a quem se dá o famoso “fakelaki”* para acelerar a intervenção cirúrgica de alguém que de outra forma ficaria em fila de espera por longos meses, ou do polícia que recebe luvas para fechar os olhos a infracções.
Cumprimentos.
P.S.: O primeiro-ministro grego deu mostras recentes de estar ciente do problema. Extracto de um artigo no site da BBC, com base num discurso proferido nesta 3.ª feira (artigo completo em http://news.bbc.co.uk/2/hi/europe/7787426.stm): “Mr Karamanlis has rejected calls to step down. But on Tuesday he acknowledged some of the problems that had fuelled the anger of young people. In a speech to parliamentary colleagues, he said "long-unresolved problems, such as the lack of meritocracy, corruption in everyday life and a sense of social injustice disappoint young people".”
* “Fakelaki”=“Envelopezinho”, em grego. Uma verdadeira instituição neste país – lembro-me de uma sondagem que mostrava que mais de metade dos cidadãos gregos já o tinham utilizado para acelerar procedimentos do serviço de saúde.
obrigada pela informação.
beijinhos
su
Bom Ano!
Beijos.
S
Jefferson
Os povos da grecia e de portugal deveriam ficar felizes por terem destronados seus reis e agoram usufruirem da republica corrupta que tem. Viva a propina republicana!
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